A outra face da engenharia civil

Evento na UFRJ revela a crescente integração socioambiental de uma das áreas mais conservadoras da engenharia

Por João Reis

A engenharia civil já não é mais a mesma. Historicamente associada ao desenvolvimento urbano e vista como uma das principais forças da economia capitalista, essa atividade profissional – ainda responsável por uma expressiva fração do uso dos recursos naturais – passa por um momento de renovação.
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Essa foi a impressão deixada pelos professores e profissionais que participaram do primeiro dia de palestras da quarta edição da Semana de Engenharia Civil da UFRJ, realizada nos dias 10 e 11 de março deste ano.

Promovido pelo Programa de Educação Tutorial de Engenharia Civil da UFRJ, o evento revelou para os estudantes de graduação e afins como uma revolução conceitual está transformando o modus operandi dessa atividade.

Hoje, as palavras de ordem são sutentabilidade, ecoeficiência e integração, tanto no plano social quanto ambiental. E o resultado acaba sendo vantajoso para todas as partes envolvidas ou implicadas de alguma maneira no processo de produção.


Esse aspecto foi ressaltado durante a apresentação de Rene Rodrigues de Abreu, engenheiro da Petrobrás responsável pelas obras do prédio do Cenpes, ainda em andamento na Ilha do Fundão. O projeto é candidato a ganhar a certificação LEED, um programa de certificação internacionalmente aceito para projeto, construção e operação de edificações “verdes” de alto desempenho.

- Pessoalmente, eu fico com a consciência tranqüila e olho nos olhos das minhas filhas de modo sincero, certo de que não estou destruindo o que elas usarão daqui a vinte ou trinta anos. E, do ponto de vista econômico, as ações da Petrobrás sobem cada vez que a empresa ganha um certificado como esse, já que existem índices específicos nas bolsas de valores que avaliam a responsabilidade socioambiental das empresas, - explicou o engenheiro.

As chaminés foram projetadas de maneira a expelir a fumaça por cima da construção, levando em consideração a direção e velocidade média dos ventos, assim como a posição das janelas do prédio.

O prédio do CENPES foi projetado de modo a aproveitar a incidência de sol diária, em termos de iluminação e a sombra, cuja incidência é medida pelo sistema de refrigeração, o qual funcionará com maior ou menor potência de acordo com a incidência sua incidência.

Gestão dos recursos naturais: engenheiros devem tomar iniciativa

A ‘engenharia consciente’ do projeto de Rene Rodrigues ganhou força com as palavras do Prof. Paulo Canedo, em sua palestra sobre gestão de recursos hídricos. O engenheiro deixou claro que é preciso uma atuação mais ativa nos campos social e político dos profissionais da engenharia, com vistas à preservação dos recursos naturais.

- Não podemos deixar a questão hídrica exclusivamente nas mãos dos dirigentes políticos, que têm uma visão de curto prazo, trabalhando em projetos que giram em torno de cinco anos. Além da perspectiva mais ampliada, as políticas devem ser adaptadas a cada país e a cada região, devido às diferentes nuances que permeiam cada lugar - afirmou.

E não poderia haver engenheiro mais gabaritado para cobrar essa nova postura dos futuros profissionais do que Canedo. Ele é um dos responsáveis pela vigência do Sistema Nacional de Gerenciamento dos Recursos Hídricos, que configura a lei 9433 de 1997, e tem como fundamento primeiro o fato de que a água é um bem de domínio público, mas que é um recurso escasso, dotado de valor econômico.

- Podemos usar os recursos naturais desde que possamos saldar nossa dívida com a natureza. Mas isso não tem sido feito. Vide o caso dos rios urbanos brasileiros, todos podres. Ou seja, não estamos pagando por nosso empréstimo.

Dando respaldo às propostas de Canedo, o engenheiro civil Rogério Costa, que trabalhou na área de Conservação Urbana nos governos de Marcelo Alencar e César Maia, na cidade do Rio, afirmou que há, no campo da engenharia, a necessidade constante de se adaptar às novas exigências sociais. E sugeriu que as escolas de engenharia oferecessem cadeiras na área de psicologia e direito.

- Somos técnicos, mas temos que nos inserir no contexto sociopolítico vigente, - explicou.

Plano Diretor da UFRJ-2020 terá engenharia inteligente

Buscando pôr em prática a nova base conceitual da engenharia contemporânea – tão falada no evento -, o Professor Titular de Planejamento Urbano e Regional da UFRJ Carlos Vainer está desenvolvendo o Plano Diretor da UFRJ – 2020.

A premissa do projeto é pensar a cidade universitária – atualmente uma ilha isolada e mal conservada - como parte integrante da cidade do Rio de Janeiro.

- Trata-se [a relação cidade universitária / resto da cidade] de um casamento mal resolvido. O Fundão está de costas para a cidade e vice-versa, - disse Vainer.

A aplicação do Plano Diretor envolverá, segundo as palavras de Vainer, muito mais que a reurbanização da cidade universitária, com a criação de espaços de cultura e lazer e revitalização do comércio e serviços, mas integrar de fato a UFRJ ao mundo exterior:

- Queremos fazer da UFRJ uma universidade contemporânea de seu próprio tempo, mais disponível aos setores da juventude e engajada num projeto de país que contemple a autonomia técnico-científica.

Revista Vetor – Ano 2 – Número 3 – Jul. 2009